sexta-feira, 22 de julho de 2011

Vodka com Chaplin - parte 1

John acorda atônito, e ao mesmo tempo incapaz de se mover na rija cama onde deitava. Abriu os olhos e contemplou o teto descascado e com infiltrações. Olha para o lado direito e vê uma cômoda com uma gaveta aberta. Sua visão ainda estava turva, mas conseguia definir algo do que conseguir visualizar. Supostamente o quarto era de uma mulher, dada à calcinha pendurada no pegador da gaveta. Vira a cabeça para a frente e pára, assustado e ao mesmo tempo familiarizado com o quadro O Garoto, de Chaplin, mestre que tanto amava. John jamais havia notado a rispidez do olhar de Chaplin nesta obra, e agora um certo receio lhe tomava as têmporas por se sentir ameaçado por este olhar.

O que lhe faz perder o foco do quadro é a suave voz feminina que vem de outra peça da casa, ou de que qualquer lugar que fosse.

Close your eyes and I'll kiss you

Tomorrow I'll miss you

Remember I'll always be true…

Quando começava a balançar o pé direito sobre a coberta no ritmo da canção, outro susto. A dona da voz, extremamente alegre, abre a porta fazendo muito barulho e lhe traz dois pedaços de pão de forma e uma xícara de chá que lembrava muito uma que sua avó tinha em casa. Sem resistência e com uma fome absurda, ele morde o pão (seco e duro) e bebe um gole do chá (frio e extremamente doce), mas não reclama. A cabeça ainda era um carrossel de sombras e sons indefinidos. Depois olha nos olhos azuis da bela loira que o assiste matar a fome e tenta se lembrar da noite passada, inutilmente. Basta forçar um pouco mais a memória para sentir uma forte dor nas têmporas e decidir que tem que ir embora. De um salto, se põe sentado na cama e procura sua roupa, também inutilmente. Ele começa a se desculpar.

- Perdão, mas eu não sei o que estou fazendo aqui. Eu bebi demais, mas preciso ir pra Chicago essa tarde e...

- Chicago? (risos) Vai demorar pra isso acontecer de novo...

- Como assim? Onde estou? Onde estão minhas roupas? Que sotaque é esse? (tambores rufando, ele aponta pra janela) O QUE É ISSO?!

Não precisou ela responder nada. Em um súbito, ele corre para a janela e desvenda a cortina, mas a neblina e o vidro embaçado o impediram de se localizar. Ele abre rapidamente a janela e sente dois choques: um térmico ao sentir o vento gelado em seu peito nu, e outro ao ver a imponente construção que se erguia após os prédios de meia altura. Os tambores rufavam muito mais alto agora. Havia uma grande movimentação nas ruas. Pessoas juntas e bastante enroupadas caminhavam em uma única direção, exatamente de onde John, apavorado, não conseguia tirar seus olhos.

O Kremlin.

Nenhum comentário: